Minha paixão pelo Kung Fu vem
desde muito cedo, quando ainda era pré-adolescente, em meados dos anos 90.
Vendo filmes do Bruce Lee, busquei aprender esta arte com um professor que
morava no mesmo bairro que eu. Durante alguns anos fui praticante e entusiasta
de arte marcial, até me envolver mais com a música e as artes em geral. Acabei
ficando mais de 15 anos sem praticar oficialmente em uma escola, porém, nunca parei
com meus estudos pessoais, alguns contatos e práticas, principalmente com
aquilo que chamam de ‘arte interna’. Neste tempo, antes de retomar os
estudos/treinos numa academia, algo de Chi Kung e Taiji, assim como movimentos
(das formas) do Kung Fu (Garça Branca, Serpente e Wing Chun), sempre estiveram presentes
na minha vida. Até que, enfim, retomei a prática efetiva com um grupo, e hoje,
além de estudante/praticante, também sou professor/instrutor da AFWK
(Associação Fluir Wing Tjun Kung Fu). Estudo e pratico quase que diariamente, e
como também sou da área da filosofia, levo muito em consideração o pensamento oriental
nestes estudos. Nisso, sempre enfatizo aos meus irmãos/ãs Kung Fu e/ou
alunos/as, que ‘não basta só treinar (fisicamente falando), é preciso
incorporar o Kung Fu’, seu ‘espírito’. Quando falo em espírito aqui, não estou me
referindo à questão religiosa, ou me remetendo ao além-divino, mas sim a
incorporação do Kung Fu como uma ‘personalidade’ mental e física a ser
adquirida, um ‘modo de ser e atuar’ na vida. Ou seja, ‘espírito enquanto
integração com o meio’, enquanto criação de um ambiente propício ao ‘ser Kung
Fu’, externa e, principalmente, internamente. Sabem quando popularmente se fala
‘o espírito do lugar’, ou ‘aqui tem um bom espírito’, ou ainda, ‘esta pessoa é
espirituosa’? É isso! É neste sentido que ‘o Kung Fu precisa, fundamentalmente,
ser incorporado’. Caso contrário, teremos mais um nome, um título ou uma
palavra, do que uma condição, o que, diga-se de passagem, acontece ou existe
muito neste meio e por aí. E para que esta ‘incorporação’ seja possível, é
preciso, além de treinar (fisicamente e tecnicamente falando), absorver o ‘espírito
do Kung Fu’ no seu próprio corpo, e mais que isso, na sua própria mente e
sensibilidade. Assim desenvolvemos uma ‘espiritualidade’ Kung Fu, em que a
palavra, o termo, passa a ter um significado mais profundo, pois, já não
falamos mais da boca para fora ou apenas mantendo o discurso e a aparência, mas
sim ‘vivemos o Kung Fu’ efetivamente e talvez, integralmente, o que não é algo
fácil, porém, podemos sim ter certa ‘parcialidade’ que, mesmo não estando
completamente mergulhado nisso, no seu todo, assim mesmo podemos integrar esta
incorporação ou composição, como músicos de uma orquestra, onde, mesmo numa
sinfonia que é feita de partes, o que mais importa é a música, a arte, e onde o
corpo, a mente ou nossa consciência, e a energia vital que nos sustenta e nos
move, possam estar equilibrados existencialmente e intelectualmente. Para isso
basta certa ‘disposição’ e/ou ‘entrega’ daquele que se permite estudar/praticar
para além do quesito físico-externo ou técnico. Contudo, isso vai refletir no
que o taoismo e também o budismo (enquanto filosofias e não religiões) chamam
de ‘o caminho do meio’. Ou seja, ‘nem muito, nem pouco, mas o suficiente’. Eis o
caminho! Eis o que o Kung Fu, já incorporado, nos pode trazer de mais profundo:
o ‘equilíbrio’ de ser-estar. Ou seja, de viver sendo Kung Fu, para além das
aparentes razões e vaidades que, muitas vezes, infestam este ‘mundo’ dito marcial.
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