(análise a partir de ‘A arte da guerra’ de Sun Tzu)
O sistema Wing Tjun (Wing Chun e/ou o Weng Chun Kuen), também
é conhecido como a ‘arte da aproximação’. Neste(s) sistema(s) se parte de uma
distância para se chegar à outra, ou seja, do espaço maior para o menor, numa
ação de contra-ataque (característica do sistema). Sei que outros estilos ou escolas
de Kung Fu também partem deste princípio e agem neste sentido, portanto, esta
análise e/ou problematização, vai além do sistema WT.
"Mantenha os amigos sempre perto de você e os inimigos mais perto ainda" (Tao Te Ching - Lao Tse)
"Mantenha os amigos sempre perto de você e os inimigos mais perto ainda" (Tao Te Ching - Lao Tse)
Referente ao título deste texto, a problemática que trago diz
respeito à alguns praticantes e escolas que interpretam e praticam como se a
‘distância curta’ fosse a única possível, ‘engessando’ assim o WT, que pode (ou
é) muito dinâmico e rico em possibilidades. Manter-se próximo demais, em muitos
casos, pode ser uma atitude um tanto arriscada (senão equivocada) deste
pensamento e desta ação. No nosso ‘modo’ (Fluir Wing Tjun), partimos da
‘distância média’ dentro da ação, para, daí sim, o encurtamento. Mas para isso,
é fundamental o conceito de ‘ponte’. ‘Criar uma ponte’ significa chegar com seu
membro no membro do oponente, porém, não é simplesmente isso. É necessário,
nesta ação, ter conhecimento e domínio técnico da ‘aderência’ ou ‘colagem’. Ou
seja, é fundamental ‘controlar’ o oponente através do controle ou domínio da
‘ponte’, tendo a ponte para si, pois ela serve para ambos, portanto, podendo
ser dos dois. Aí, além do conhecimento e domínio (teórico e prático) do
conceito, outro fator impreensindível é a habilidade que faz chegar antes.
Geralmente, os ‘contra-ataques’ mais efetivos e contundentes
do WT partem da ‘distância curta’, algo típico do sistema. Mas, penso que
existe uma confusão quando se afirma isso sem o devido contexto, sem as devidas
técnicas e abordagens do tema, que é maior do que simplesmente ter esta
distância como algo único à ser pensado e praticado. Para ser efetivamente
‘defensivo’ (ou seja, ser uma ‘auto-defesa’ – falo aqui em proatividade, no
caso, antecipação), é necessário antes ter uma boa sensibilidade e visão
(questão de ‘inteligência marcial’ e/ou estratégia). Na importante obra ‘A arte
da guerra’, Sun Tzu ensina que “é melhor
ganhar a guerra antes mesmo de desembainhar a espada”. Ou seja, ‘a melhor
vitória é aquela que se vence sem precisar lutar’. E isso é que é ‘defensivo’,
no seu sentido mais ‘puro’. Quando se necessita usar o corpo para se defender e
atacar, já não se é mais tão defensivo quanto comumente se diz ou se vende no
discurso publicitário de algumas academias ou escolas marciais por aí. Porém,
às vezes, o uso do corpo pode acontecer. Por isso, precisamos praticar a modo
de estarmos preparados também para o uso técnico e consciente das habilidades
que são possíveis pelo bom uso dos movimentos corporais (e da ‘inteligência
marcial’ que é estratégica e sensível). Quando as habilidades físicas e
técnicas estiverem mais aprimoradas, técnica e consciência se tornam
‘naturais’, ou seja, passamos a ter os movimentos e o uso da energia (força
interna-externa) como algo ‘natural’, como se fossem ‘automáticos’, sem que
precisemos pensar muito. Aí o corpo e seus movimentos passam a ter o importante
‘equilíbrio’ com a mente e a energia. Mente e corpo relaxados e flexíveis,
dinâmicos. Energia bem utilizada. E é isso que a prática bem orientada, concentrada,
aprofundada, dinamizada, flexível, gera: ‘fluência e habilidade’ (além do bom
uso da energia interna que diminui consideravelmente o desgaste e a força
físicos).
No Capítulo VII, de ‘A arte da guerra’, intitulado ‘Da arte
do confronto’, Sun Tzu anotou que “é
preciso tornar próximo o que está distante”. E é aqui que entra a
habilidade já comentada acima, de saber lidar com as duas ‘distâncias de ação’
(considerando o conceito taoista de ‘não-ação’ e do próprio Wing Tjun de
‘não-luta’). No mesmo capítulo, o mestre Tzu continua: “É preciso estares perto quando o inimigo acredita que estás longe;
(...) atacá-lo quando ele menos espera, e sem que ele possa reagir.” Aí
entra a habilidade desenvolvida com a prática e o conhecimento do conceito e
domínio da ‘ponte’ na prática. Também trabalhamos aqui com o conceito de
‘vento’ ou ‘fogo’ (elementos simbólicos a partir da natureza), estudados e
praticados em algumas escolas de Kung Fu e/ou WT, como ‘intensidade’ (que se
integra com velocidade) dos movimentos e aplicações (ataques e defesas). Neste
mesmo contexto, Tzu segue dizendo que é fundamental “te manteres em constante vigilância para não seres surpreendido, (...)
para aproveitar o momento exato de surpreender o adversário.” Em outro
momento, continua: “Se for preciso ficar
firme em teu posto, fica imóvel como uma montanha. Se tiveres que sair para
pilhar, age rápido como o fogo (...) como o relâmpago.” Aqui aplicamos
outro conceito de cunho taoista, a ‘atenção plena’ ou ‘consciência plena’, que
acontece a partir das práticas de Chi Kung e meditação, o que também chamamos
de ‘mergulho no vazio’ (além do elemento de intensidade ‘fogo’, já citado
acima). Depois chama a atenção: “Evita
movimentos inúteis”. Aqui uma concepção presente no sistema WT, o de
‘economia de movimentos’, que se aproxima ao conceito taoista de ‘equilíbrio’
(‘nem muito, nem pouco, o suficiente’), assim como o budista de ‘o caminho do
meio’. Ambos aplicáveis e substantivos, neste caso.
A partir do conceito de ‘ponte’, ‘dissimulamos’. Ou seja, aplicamos
contra-golpes ‘invisíveis’ ao oponente, através de caminhos inusitados, da
‘inteligência marcial ou estratégica’, e mais que isso, através da
‘naturalidade’ dos movimentos físico-corporais, adquiridos pelos estudos
teórico-conceituas e pela prática. Referente a isso, Tzu nos diz: “Assim, elege uma via indireta e confunde o
inimigo, enganando-o. Dessa forma, poderás colocar-te a caminho depois dele e
chegar antes. Aquele que for capaz
disso, compreende o significado da abordagem direta e indireta.” Relacionamos
isso com a ideia estratégica de que ‘ponte feita ou aberta, entra, ponte
fechada, dissimula para que se abra, uma vez aberta, não hesite, entra’. Por
fim, referente a ‘arte da aproximação’, Tzu nos ensina que “Quem conhece a arte da aproximação direta e indireta será vitorioso.
Eis a arte do confronto.” (ver Capítulo V de ‘A arte da guerra’: ‘Do
confronto direto e indireto’).
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