Taoismo, confucionismo e budismo são as 3 concepções de mundo e/ou conhecimentos (filosofias e práticas de vida) que constituem os principais e maiores fundamentos do pensamento chinês. Ambos também constituem as bases conceituais e filosóficas do que popularmente se chama Kung Fu (artes marciais de origem chinesa). Sendo o taoismo e o confucionismo originários da China, enquanto o budismo tem sua origem na Índia. Estas concepções de mundo (vamos assim chamar), iniciaram como conhecimentos e filosofias, dotadas de princípios próprios, herdados de outros vários conhecimentos antepassados. Um elemento que é comum à ambas concepções é a ‘espiritualidade’ (o que não significa necessariamente ‘religião’). Nisso, devemos levar em conta que na tradição chinesa a espiritualidade não se separa da prática cotidiana, material, nem do pensamento ou da filosofia (o que envolve a ciência). Não pelo menos como aqui no ‘ocidente’.
Religiões?
O taoismo e o confucionismo, não nasceram como religiões, mas
foram tornados como tal por ‘alguns grupos ou linhas de pensamento’ com o
passar do tempo. Mas, existem grupos, linhas e adeptos do
taoismo, por exemplo, que o praticam de forma ‘não-religiosa’, mas como ‘prática de vida’, o que envolve, além de seus princípios fundamentais e conceitos, certa espiritualidade (leia-se religião aqui, a prática
institucionalizada da crença). Então, reduzir estas concepções em mera religiosidade
é não dar a devida atenção para suas histórias e todos os conhecimentos que elas
representam.
Integração cultural
Na história costumamos trabalhar dois conceitos para a melhor
compreensão de fenômenos e relações históricas: ‘choque cultural’ e ‘integração
cultural’. O choque geralmente se dá
quando duas culturas diferentes entram em contato e não se integram, ao contrário,
acabam se estranhando e combatendo uma a outra. Já a integração, é justamente o contrário, acontece quando estas culturas
interagem e uma influencia a outra, formando muitas vezes uma nova realidade
sociocultural. E foi isso o que aconteceu entre estas diferentes concepções,
culturas ou conhecimentos.
O taoismo antecede o
confucionismo e o budismo na China
Por desinformação ou interesse ideológico, já vi pessoas
dizendo que o taoismo copiou o budismo. Para saber se isso é verdade ou não,
é fundamental olhar para a história destas concepções e da própria China. Quando
o budismo chega na China, por volta do século II depois de Cristo, o taoismo,
assim como o confucionismo já existia(m) há séculos naquele território. O que
aconteceu foi uma influência mútua entre estes 3 grandes conhecimentos (porém
nem toda linha de pensamento e prática taoista se influenciou pelo budismo e/ou
pelo confucionismo, algumas sim). Já com o budismo, foi diferente, tanto que
ele assume um ‘caráter chinês’ quando entra em contado com estas concepções que
já existiam na China antes da sua chegada. Nisso, o budismo indiano acaba
absorvendo algumas ‘características chinesas’, sobre tudo taoistas (o que deu origem
ao ‘budismo chan’, por exemplo). Ou seja, aconteceu bem o contrário do que
alguns pensam, sendo o budismo o mais influenciado nesta ‘integração cultural’
dentro da China, originando assim, inclusive, o que podemos chamar de ‘budismo
ao modo chinês’, que é bastante popular no meio do Kung Fu, diga-se de passagem
(aí temos o famoso templo de Shaolin, um monastério budista onde alguns ‘estilos’,
não todos, de Kung Fu se desenvolveram).
Contudo, é importante destacar que o taoismo é anterior ao
confucionismo, já que também inspirou Confúcio em alguns aspectos de seu
pensamento (conceitos, princípios e ideias), o que está claramente registrado
nas suas escritas (para uma melhor compreensão deste fenômeno é necessário certo estudo conceitual e relacional entre as obras destes pensadores e seus contextos históricos).
Para melhor visualizar esta questão, a localização dos períodos
históricos é fundamental. Se pensarmos a origem destas concepções a partir de
seus principais pensadores (como sendo fundadores das respectivas
filosofias/religiões), veremos que ambas são praticamente contemporâneas, ou
pelo menos do mesmo século, onde algumas fontes trazem:
- Lao Tse, taoismo, por volta do século VI a.C. (cerca de 500
a 600 anos a.C.)
- Kung Fu-Tsu (Confúcio), confucionismo, por volta do século
VI a.C. (cerca de 400 à 500 anos a.C.)
- Sidarta Gautama (Buda), budismo (na Índia), por volta do século
VI a.C. (cerca de 500 à 600 anos a.C.)
Referente às principais obras e escrituras que inspiram ou,
em outra perspectiva, fundam estas concepções, temos:
- ‘I Ching’, versão 'lendária': cerca de 3000 a.C., hipótese 'histórica': cerca de 1122 / 1150 a.C. (citado como uma das
principais obras assimiladas pelo taoismo, parte importante na constituição
desta filosofia)
- ‘Tao Te Ching’ de Lao Tse (taoismo), cerca de 500 a.C.
- Clássicos confucianos, cerca de 500 a.C. / ‘Analectos’, entre 500 à 200 a.C.
(confucionismo)
- Escrituras budistas como o ‘Tripitaka’ (budismo), de 500 à
100 a.C.
A partir destas informações relacionais ou comparativas,
podemos perceber que ambas concepções, tendo como ponto de partida seus
pensadores e/ou escrituras, são mais ou menos contemporâneas. Porém, segundo as
fontes mais usuais, o budismo só chegou na China, por volta do século II depois
de Cristo (200 anos d.C.), o que comprova que entre as 3 concepções de maior
projeção no pensamento chinês, o budismo é a mais recente. Portanto, o taoismo,
definitivamente, não copiou o budismo, no máximo, em alguns aspectos e em ‘algumas
linhas’, absorveu algumas características dele. O budismo, por sua vez, foi quem mais
sofreu influência taoista da sua inserção na China.
O taoismo antes do nome
Uma terceira via de percepção, concepção ou crença, diz que muito antes do taoismo ter este conceito ou nomenclatura, ele já existia, pois
muitas práticas e princípios que passaram a ser chamados de ‘práticas taoistas’
datam de milhares de anos antes de Cristo. Alguns remontam estas práticas ao
séc. XVII a.C. (cerca de 1600 anos a.C.), outros ainda, ao séc. XXVI (cerca de
2500 à 3000 anos a.C.). O Chi Kung (ou Qi Gong) por exemplo, muito
antes de receber este nome, já era praticado nos interiores da China antiga,
assim como já eram feitos estudos relacionados à tratamentos e curas através do
uso de plantas e técnicas energéticas, que foram desenvolvidos por antigos
mestres e mestras da natureza, uma espécie de xamãs nativos, como são chamados aqui da América, que mais tarde
foram identificados ou nominados de taoistas. Foram destes conhecimentos
milenares organizados e registrados que nasceu a MTC (Medicina Tradicional
Chinesa), o que é muito relacionado ao conhecimento taoista, como herança destes
antepassados que, provavelmente não se autodenominavam. Por isso datar o taoismo é algo sempre arriscado, já que ele se constituiu ao longo do tempo, e assim, tem origem incerta, relativa ao que se considera na sua caracterização.
Em suma, o fato é que, quando grandes
concepções se relacionam e dialogam, enriquecem o mundo, a história, o
conhecimento, e independente do nome que carreguem, são valores que no mínimo
contribuem para uma vida mais ampla, plena e possível de ser vivida.
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