HS: Pois bem... A
associação é muito jovem, e nossa organização curricular ainda está em
construção. Mas, vou responder a partir do que já está funcionando. Dentro do
nosso currículo possuímos 6 níveis sem armas, e 7 formas dentro destes níveis (algumas
delas ainda estão em construção - estudos), e 2 ou 3 níveis com armas (também
em construção). Ou seja, o currículo não é fechado. Devido ao fato de não seguirmos
linhagem específica, temos esta possibilidade. Cada nível tem sua forma (o 3º,
tem duas). As formas, como todos já devem saber, guardam as técnicas e seus
conceitos (posturas, movimentos, aplicações, técnicas...). O aluno que
ingressa, começa sem faixa, só com uniforme, e relativamente (depende do
nível/grau que chegue), chega ao 1º nível em 1 ano e meio, ou dois anos de
prática, mais ou menos (conste que os estudos/práticas são um pouco lentos,
pois estudamos arte 'interna' e 'externa', teoria e prática, ao mesmo tempo,
conforme a necessidade de cada estudante e o avanço do grupo como um todo
também). Ao chegar no 1º nível (Siu Nim Tao), o estudante recebe a faixa azul,
2º nível (Chum Kiu), faixa verde, e assim por diante. O tempo é relativo ao
avanço técnico e conceitual/filosófico (taoismo, budismo e um tanto de Sun Tzu
e Kung Fu-Tzu ou Confúcio são estudados – conceitos aplicados na prática e
questões filosóficas). Mas, o mais importante 'observado' é o que chamo de
'incorporação' do Kung Fu. Ou seja, o que o aluno aprende, desenvolve e passa a
praticar 'na vida', para além do quesito ‘marcial’, e não se ele é simplesmente
bom tecnicamente falando. Quanto as técnicas, sim, tem as básicas e as
avançadas. Aí é por nível. Porém, desde o começo, trabalhamos algumas técnicas e
movimentos que são considerados 'avançados', pelo fato de experimentar e
aprender desde cedo como o corpo ou a expressão física vai se alterando com as
práticas. Mas tudo muito bem pensado, conforme a condição do estudante e/ou do
grupo, nada forçado. A questão das aplicações não é meramente técnica, mas sim
de desenvolvimento e integração entre 'mente, corpo e energia' – nosso mote, com
ápice na 'habilidade' desenvolvida e ‘equilíbrio’. Este é o foco em se tratando
de aprendizado. Por isso, não existe um tempo fixado ou definido, apenas uma
organização básica para se avançar dentro do currículo. Nisso, o tempo é
relativo. Como nossa prática é 'taoista' (filosoficamente falando), o que vale
é o 'caminho' e não o pretenso ou suposto 'fim', pois, conforme esta
'filosofia', não existe fim, mas apenas o caminho. E é basicamente isso que
consideramos. Quem tem pressa ou certa ambição, quem almeja a disputa, não
consegue avançar, e geralmente nem ficar dentro do 'sistema'. Buscamos um
'processo natural' de desenvolvimento, onde as regras existem para 'organizar'
os estudos. O mais é FLUIR! Um dos sentidos que, justamente, dá o nome à
associação.
CMC: Vocês tem
algum tipo de hierarquia formal entre os praticantes (instrutor, assistente,
professor etc.) e isso dependeria de um avanço formal no currículo?
HS: Sim, mas uma
hierarquia no sentido de ‘organização’ e respeito ao conhecimento que os mais
experientes (‘graduados’) trazem, sempre com vista e respeito ao conhecimento
ancestral. Instrutor, a partir do 3º nível (Sap Yat Chi Tao), faixa verde /
camiseta azul. Ajuda nas aulas e instrui 1º e 2º níveis. Ao todo são 4 faixas (azul,
verde, vermelha e preta) e 4 camisetas (cinza, azul, preta e vermelha), para
demarcar os 'níveis'.
CMC: Muito legal!
Muito mesmo... E na questão das relações entre as escolas que entram na
composição do currículo? Entendi que não há "invenção" de nada,
entendendo que continua sendo possível apontar dentro do currículo o que
proveio de cada escola, mas como se dá a escolha e ligações entre as técnicas e
conteúdos desses diferentes estilos para gerar a coerência do ensino e do
desenvolvimento pessoal? Imagino que vocês devam ter considerado tanto ligações
"externas" entre elas (tipo, "essa forma vem primeiro porque
apresenta posturas mais fundamentais que esta segunda aqui já pressupõe
familiaridade"...) e "internas" (conceituais, de
sensibilidade...). É por aí? Em algum momento prevê-se uma síntese dessas
escolas/técnicas/conceitos (mesmo que a nível pessoal)?
HS: A relação
entre as 'escolas' (prefiro 'modos' e 'estilos', pois escola denota localização
a partir de linhagem ou família específicos, 'oficiais'), se dá justamente na
'essência', ou seja, ambas escolas, modos ou estilos, tem uma mesma 'essência'
ou 'matriz', que, neste caso, além dos movimentos ‘externos’, é a 'prática interna',
a partir justamente do taoismo e budismo (enquanto aparato
conceitual-filosófico), da história (todas do Sul da China) e da simbologia (a
exemplo, animais-símbolo 'Garça e Serpente'). São 'estilos' diferentes, mas
'parentes’, como de uma mesma família, onde a grande semente é esta ‘essência’.
Por isso, o nosso âmago é a essência. Nenhuma das artes estudadas/praticadas é
distante ou divergente, muito pelo contrário, dialogam e se integram. Não há
invenção, pois tudo o que fizemos/estudamos/praticamos já existia e existe. O
que há, é uma 'adequação' a nossa realidade local, minha (como professor) e de
cada um (praticante), organizada no nosso currículo, tendo ciência e considerando
nossos limites e possibilidades. A realidade é uma necessidade fundamental. Por
isso não copiamos, mas interpretamos, ‘traduzimos’, estudamos. A 'coerência' é
esta. A 'experiência', a prática, a partir de várias considerações, pesquisas,
estudos. A sequência das formas é basicamente a mesma de outros 'modos' ou
currículos de Wing Chun. A diferença são as integrações no caminho, ou seja, a
inclusão de mais elementos (conteúdos e formas). Ao organizar o currículo,
considerei o que aprendi e o nível ou grau dos meus estudos. Ou seja, juntei as
experiências e conhecimentos que possuo para organizar este currículo. A
questão dos 'modos' 'interno' e 'externo', se dá de forma gradual e integrada.
Ou seja, o Chi Kung acompanha, desde o início, a prática, os estudos, junto aos
movimentos e técnicas do Wing Tjun. Síntese? Não sei se é uma síntese, mas sei
que é uma consideração, no mínimo, ou uma integração. Porque, como já disse
antes, não é a 'formalidade' nossa questão, mas sim, a essência. O que já temos
alguns exemplos na prática real, da vida, independente se é técnica, luta,
defesa pessoal. O nome é de menos. Mas o 'resultado' para a vida, é a questão.
Alunos já passaram por questões complexas, e se saíram bem delas, passando por
elas, ou melhor, deixando-as passar (leia-se conceito no taoismo: 'deixar ir' ou
‘passar’), graças aos estudos/práticas. E isso é fluir. 'Mente, corpo e
energia' em equilíbrio para fluir em situações difíceis, complicadas,
complexas. A questão 'defensiva' principal está aí, na 'proatividade'
(antecipação do problema). Depois, se necessário, o uso de técnicas físicas.
Mas isso deve ser reflexo do estudo, do treino. Como diria Sun Tzu: 'vencer a
guerra sem mesmo desembainhar a espada', fluindo. Isso é 'estar no caminho'. E
isso, pra nós, é fluir, o quem vem de encontro com nosso currículo, nossos
estudos, práticas cotidianas, com o fundamento da AFWK...
Dezembro de 2017.
Nenhum comentário:
Postar um comentário