sexta-feira, 9 de agosto de 2019

'Armas' e 'luta' no Kung Fu: quais são as suas?

Kung Fu não é um sistema ou estilo de 'arte marcial', mas sim, um apanhado de conhecimentos que desaguam num grande conhecimento que inclui vários sistemas e/ou estilos. Junto a 'marcialidade' existem princípios que norteiam este conhecimento (infelizmente não considerados, como deveriam pelo menos, por muitos).
No contexto histórico, o Kung Fu surge na China antiga como instrumento de 'auto-defesa', a partir de mestres, no seu âmbito familiar e/ou comunitário, e em templos, em que desenvolvem técnicas integradas com certos princípios. Logo ele foi aplicado ao contexto da guerra, no treinamento militar dos exércitos imperiais, assim como, também usado nos grupos rebeldes ao domínio imperial.
Nisso, grande parte (ou quase todo) o Kung Fu neste contexto (antigo), se utilizou, além do fator físico-corporal e das estratégias (a partir de estudos, conhecimentos e da mentalidade), de instrumentos ou ferramentas, inicialmente de trabalho, que se tornaram armas. Portanto, a história do Kung Fu (para além do fator esportivo e ou moderno urbano das escolas ou academias), sempre foi marcada pelo uso de instrumentos (armas), a exemplo do exército e da guerra.
Dado este contexto, atualmente alguns praticantes e/ou entusiastas olham para o Kung Fu como se ele fosse simplesmente uma 'modalidade esportiva' de 'combate regrado de mãos limpas', ignorando um contexto maior, reduzindo assim este conhecimento. É fato que o Kung Fu pode (e deve) ser usado para diferentes 'fins' ou situações. Porém, ao invés de ficarmos arrotando 'verdades absolutas' sobre este conhecimento, seria mais prudente e inteligente perceber que, nem tudo no Kung Fu é luta, sob tudo desarmada.
Compreender os vários aspectos que envolvem este conhecimento, esta arte milenar e tão atual, é trabalhar a amplitude da visão e da sensibilidade. Nisso, é possível rever alguns conceitos e aplicá-los de formas distintas, onde 'luta' pode ser diferente de 'auto-defesa', que, por sua vez, é diferente de 'disputa', que é diferente de 'guerra', etc., e que, no tempo físico da realidade material, 'mãos limpas/livres' e 'mãos armadas', implicam em situações diferentes, assim como 'jogar dentro de regras específicas' com cuidados específicos, é bem diferente de 'atuar na realidade caótica da vida'. Portanto, temos aí, dois conceitos ou concepções de 'luta', e talvez, numa delas, seja mais apropriado falar em 'auto-defesa'.
Sim, o uso técnico e bem habilitado do corpo, pode ser tido como uma arma. Porém, mesmo assim, é diferente de um outro corpo também tecnicamente habilitado, só que, portando uma arma que funciona como uma extensão deste próprio corpo. Então, diferente do que alguns julgam, estilos, sistemas ou modos diferentes de Kung Fu exigem ou são bem aplicados ou efetivos em diferentes realidades e/ou contextos. Nisso, toda comparação não passa de subjetividade. Por isso, é fundamental conhecermos a arte (estilo, sistema ou modo) que estudamos/praticamos, para que não hajam equívocos conceituais, de concepções, percepções e, portanto, de aplicações destes conhecimentos na vida.
No vídeo que segue, um 'jogo' (ou esporte) que demonstra e pratica o uso de armas no Kung Fu. Com sua habilidade e de 'mãos limpas', você acha que lutaria ou se defenderia de igual para igual (com uso das suas técnicas e golpes) contra um praticante destes armado? Então, de 'mãos limpas', dentro deste contexto, qual 'luta', quais 'armas' (estratégias, conhecimentos, inteligência marcial - quais fundamentos filosóficos e práticos) seriam mais adequadas ou propícias para manter a integridade física (vida)?




Tai Chi (Yin-Yang) e o Taoismo

O símbolo ao lado é muito antigo e não possui uma data precisa.. estamos falando de centenas ou milhares de anos.. historicamente tornou-se o principal símbolo do Taoismo (filosofia e espiritualidade de origem chinesa - que foi tornada religião por algumas linhas).. o termo-conceito Taoismo não é tão antigo, mas algumas das suas práticas datam de em torno de 5.000 anos antes de cristo, sendo melhor visualizadas e conhecidas por volta do século XVII a.C., a partir do filósofo chinês, o sábio Lao Tse, na sua obra Tao Te Ching (o 'Livro do Caminho e da Virtude')..
Antes mesmo de seu título, o Taoismo em forma de algumas práticas, já existia.. uma destas práticas é o cultivo de energia (práticas físico-corporais, energéticas e mentais), o que mais tarde ficou conhecido como Chi Kung ou Qi Gong.. em torno de 5.000 a.C. algumas destas práticas já existiam.. coletores e camponeses/as, organizados em pequenas comunidades, baseados na observação e estudo do fluxo da Natureza, desenvolveram estas práticas para viverem melhor junto da Natureza.. aprenderam que, respeitando seu fluxo, suas condições, se vive melhor e com maior naturalidade.. então, no Taoismo, a Natureza é a grande mestra, munida de uma energia própria, uma espiritualidade, da qual também fazemos parte.. nisso, alguns mestres e mestras deste tempo, como Xamãs (pois também trata-se de uma cultura nativa milenar), desenvolveram práticas mentais, energéticas, espirituais e físico-corporais para viver em integração com as naturezas (interna e externa)..
Nisso, o símbolo chamado de Tai Chi, popularmente de Yin-Yang, justamente representa esta condição harmônica entre os 'polos de energia' que existem na Natureza, na Vida.. ou seja, em suma, o 'Equilíbrio'.. este conceito, concepção e/ou teoria, se aplica nos vários âmbitos da vida e da cultura taoista, que além de filosofia e espiritualidade, é ciência.. sim, mas não uma ciência como a ocidental cartesiana.. difere dela em vários aspectos.. a base da medicina tradicional chinesa (MTC), é Taoista, e tem este conceito (Tai Chi) como fundamento essencial.. meditação, acupuntura, Chi Kung de cura, massagens, fitoterapias, etc., somados a práticas cotidianas de cultivo de energia e alimentação, são bases deste grande e profundo conhecimento.. além do Chi Kung, o Tai Chi Chuan e alguns modos de Kung Fu também fazem parte deste conhecimento..

Entre a aparência e a essência, um abismo

Dado ao mundo dos negócios, o mercado e/ou capitalismo (como políticas ideológicas e publicitárias que objetivam o consumo, a venda e o lucro), como faz com outros símbolos ou representações culturais, utiliza a simbologia para seus fins, muitas vezes distorcendo seu sentido e fundamento, tornando-a mais um produto ou aparência (não essência).. e o Tai Chi, muitas vezes também acaba sendo vítima deste uso distorcido ou inapropriado, não só pelo mercado ou publicidade, mas, infelizmente, também por algumas escolas, associações ou empresas de artes marciais e/ou Kung Fu, que não tem nas suas filosofias ou práticas a essência deste conhecimento, mas apenas a aparência.. então, é muito comum vermos o Tai Chi sendo usado deliberadamente sem seu significado essencial e fundamental sendo respeitado.. assim como, em tantos outros casos, de tantas outras filosofias que vemos por aí.. por isso, cabe, para quem estuda e quer realmente relacionar-se com o conhecimento, com o fundamento e/ou essência das coisas, o necessário discernimento...