domingo, 23 de dezembro de 2018

Wing Tjun em síntese: fruto do sincretismo


Sincretismo:síntese, razoavelmente equilibrada, de elementos originários de diferentes visões de mundo ou de doutrinas filosóficas ou religiosas distintas, com reinterpretação de seus elementos.

Síntese: “método, processo ou operação que consiste em reunir elementos diferentes, concretos ou abstratos, e fundi-los num todo coerente.


Aplicado ao Wing Tjun (Wing Chun e Weng Chun Kuen), o sincretismo é uma síntese do que seja este sistema, esta arte, este conhecimento. Desenvolvido(s) no período imperial chinês (dinastia Qing, dos manchus – último governo da fase imperial chinesa), a partir de outros conhecimentos, estilos ou sistemas de Kung Fu (sob tudo Garça Branca e Serpente), por estudiosos e/ou mestres, com o intuito de se auto-defender da repressão do exército manchu que assolava naquele período o sul da China, o Wing Tjun é fruto de um sincretismo filosófico e prático. Ou seja, surge da fusão entre estilos ou sistemas diferentes (mas que se relacionam) de Kung Fu. Estilos externos e internos. Os estudiosos que desenvolveram o Wing Chun e Weng Chun Kuen (artes/conhecimentos irmãos) eram praticantes ou mestres de outros estilos (entre eles figuram a Garça Branca e a Serpente). Também eram praticantes de Chi Kung e/ou Tai Chi Chuan (independente se levavam, na época, estes nomes ou não, pois, as artes internas são antigas, existem muito antes do Wing/Weng Chun), o que faz com que o Wing Tjun também seja uma arte interna (além de externa) em sua essência. Além dos estilos ditos ‘marciais’ que o compõem, também temos o aspecto filosófico.


Kung Fu como cultura viva:

"Um homem nunca se banha duas vezes em um rio, pois na segunda vez nem ele é o mesmo homem, nem o rio é o mesmo rio." (Heráclito de Éfeso)

Segundo o filósofo grego Heráclito, "nada é permanente, exceto a mudança", ou seja, tudo está em transformação, tanto a natureza quanto o ser humano. Em suma, tuto flui, tudo muda. Por isso, quando falamos em conhecimento (em um conhecimento, amplo, profundo e diverso, como o Kung Fu, por exemplo), falamos em 'cultura', e quando falamos em cultura, falamos em soma de conhecimentos, estes, que abrangem certos saberes, teorias, certas práticas. Nisso, a cultura é resultado das respostas que os diversos grupos humanos produziram (e produzem) ao longo do tempo, para melhor satisfazer suas necessidades, o que resultou em um conjunto de conhecimentos teóricos e práticos, um tipo de sistema simbólico que se aprende e se transmite aos outros como legado histórico, permitindo interpretar e integrar a realidade, dando assim, sentido à vida humana. Nesse processo, o indivíduo não só aprende a cultura dos seus antepassados, mas também cria novos aspectos que a renovam. Ou seja, um estilo, sistema ou 'modo' de Kung Fu, assim como toda cultura, se movimenta, pulsa, é vivo, portanto, está sempre mudando, nem que seja nos detalhes quase invisíveis, conforme a passagem do tempo e as necessidades que esta mudança suscita. Eis que, é neste movimento de transformação, que tal sincretismo acontece. 


Filosofia(s), conceitos:

Muitos acreditam que o Wing Tjun é filosoficamente budista. Porém, isso não é fato consumado, pois, na época, budismo e taoismo já se relacionavam enquanto filosofias que aparelhavam conceitualmente vários estilos de Kung Fu, entre eles, o Wing Tjun. A relação entre budismo e taoismo é antiga. Por tanto, penso ser um erro afirmar que o WT seja budista. Esta afirmação está pautada na crença da existência do templo Siu Lam (Shaolin do Sul), como sendo um templo budista que, supostamente teria sido destruído em um incêndio. Mas, não existem provas que apontem para a real existência deste templo. Então, muitos acreditam que ele tenha sido inventado como estratégia para esconder a existência de uma sociedade secreta que abrigava o Wing Tjun, seus estudos e estudantes. Nisso, ser budista, ou ter o budismo como aparato conceitual/filosófico ou religioso, é relativo ao praticante, mestre, linhagem, família, escola ou modo de Wing/Weng Chun. Na maioria dos casos, ambos, budismo e taoismo, aparelham o sistema Wing Tjun em seu caráter filosófico e/ou religioso.


AFWK e o Wing Tjun taoista:

Como escola ou associação, nosso ‘modo’ a que chamamos de Wing Tjun, por admitir e estudar/praticar tanto o Wing Chun quanto o Weng Chun Kuen, concebendo-as como artes irmãs, além do Chi Kung e aspectos do Tai Chi Chuan, I Chuan, da Garça Branca e da Serpente, temos como base teórico/filosófica e conceitual, o taoismo (e alguns aspectos do budismo e até do confucionismo, em menor grau, como conhecimentos que fazem parte da cultura chinesa e do Kung Fu).

Em suma, nossa concepção enquanto organização percebe e admite nossa arte como sendo fruto de um sincretismo. Ou seja, de uma integração de conhecimentos diferentes, mas que se encontram e dialogam a partir de uma mesma essência. E é esta essência que consideramos fundamental na incorporação do sistema, da arte ou conhecimento. Nisso, é partir do taoismo filosófico que podemos compreender e unificar estes conhecimentos diferentes, mas não impossíveis ou contraditórios, pois, é na essência, na raiz, que está o ‘mistério’ que faz desta percepção e prática um conhecimento profundo e dinâmico. Ou seja, uma síntese histórica, fruto do movimento dialético (ver conceito/concepção no taoismo, em Heráclito e Marx) que criou o terreno possível para que o Wing Tjun pudesse existir e ser o que é, não um fim em si mesmo, mas um campo flexível e fluente de possibilidades.




sábado, 15 de dezembro de 2018

Diversidade religiosa e de pensamento: o que vejo atualmente no Brasil?

O que vejo, com certa tristeza, é um país governado pela ignorância, exploração alheia, intolerância e determinismo. Além de muito preconceito, discriminação, ódio, violências. E que tudo isso pode piorar num futuro não tão distante.  Com a eleição de Bolsonaro, se desenha um Estado conservador na ideologia ou pensamento, e neoliberal na economia. No projeto deste ‘novo-velho’ governo, o que vejo são ministérios tomados por militares e religiosos ditos cristãos, que usam politicamente o evangelho e certo discurso vitimista, em benefício próprio e dos seus, a exemplo da futura ministra Damares, para uma pasta chamada ‘Família, Mulher e Direitos Humanos’, e que também vai presidir a FUNAI.

Como professor, dado o contexto e inúmeras declarações provindas destes seres políticos, me sinto desrespeitado, desvalorizado, desconsiderado, ofendido pelo discurso vigente que a todo o momento supõe que o professor doutrina, ilude, perverte seus alunos, como se estes fossem ‘frascos vazios’ sempre prontos para serem cheios, e o professor um ser ordinário, como um doutrinador qualquer que abusa de seus fiéis, como é muito comum, infelizmente, em várias igrejas do Brasil. Porém, felizmente, grande parte da população não pensa nem age assim.

Como taoista (filosoficamente falando) sou minoria. Respeito todas as manifestações religiosas e filosóficas que se dignificam a partir de princípios humanizados, no sentido de respeitar a diversidade e a natureza. Mas, certo discurso de tom fanático extremista ou fundamentalista cristão (ou dito cristão), está causando sérias distorções e divergências no mundo das crenças e dos fundamentos filosóficos. Um discurso que se coloca como o único e verdadeiro, diminuindo os demais e, muitas vezes, os discriminando e atacando violentamente, podendo gerar assim um grande desequilíbrio mental, cultural, social e humano. O risco de um fundamentalismo religioso que traz consigo o totalitarismo autoritário, a partir dos discursos deste nível, pode se tornar uma prática, e assim sendo, é a violência psicológica, moral e física que são os resultados desta ‘motivação’ (estes discursos são ‘motivadores’ em algum sentido), que acabam inspirando pessoas a agirem.


Taoismo em relação à crença e ao mundo

No taoismo não existe o conceito de Deus ou de uma única verdade divina provinda de um ser superior único e masculino, como é nas grandes religiões monoteístas, por exemplo, (judaísmo, cristianismo e islamismo). Mesmo porque, antes de ser tornado religião ou doutrina, o taoismo é uma filosofia, uma cultura ou conhecimento, milenar, e devido à passagem dos anos e inserções culturais, tornou-se algo heterogêneo. Não pregamos nem rezamos. Nossa prática é a de contemplação da natureza e meditação (além dos estudos, diálogos e outras práticas energéticas, físico-corporais, alimentares e de relações socioculturais). Neste sentido, praticamos mais o silêncio do que a oratória (isso não significa que somos ateus). Temos a natureza como a grande mãe, com sua energia vital e renovadora (suas mutações e fluxos), que nos permite seguir naquilo que se chama vida. Ou seja, é a própria vida e seu fluxo natural que rege nossa estada e passagem por este mundo material, onde espírito ou energia estão conectados a esta natureza maior, onde ambos, formam a vida. Por isso o conceito utilizado por nós para pensar sobre isso é o de Caminho. Respeitando as necessidades (nossas e as alheias) e a naturalidade das coisas vivas, é que caminhamos na busca do equilíbrio (outro conceito fundamental). Estar neste Caminho é viver conectado com a essência desta natureza, estar junto ou dentro dela, e assim, dentro do Tao. Tao é um ‘não-conceito’, ou seja, algo que não tem explicação racional, mas pode ser entendido de forma mais superficial, também como o próprio Caminho. Nisso, Tao é a essência e o fundamento de todas as coisas vivas, e bem por isso ele não precisa existir na racionalidade, pois ele está por dentro, e ao mesmo tempo, abraça toda a existência. Por isso não é ciência, e nem apenas uma crença, como muitos pensam. É algo que pode ser experimentado, ou seja, algo que se sente e passa a se incorporar, a partir de algumas práticas cotidianas, independente do que se acredita ou se sabe dele. Com isso, não desprezamos a crença ou fé, nem a ciência, tanto que, uma das ciências mais antigas organizadas, é a taoista. Apenas não enaltecemos isso como verdades únicas e absolutas, e bem por isso podemos divagar entre todos estes conhecimentos, respeitando-os, sem distinção. Mas isso não significa que devemos acolher tudo. O fundamentalismo extremista, seja ele religioso ou ideológico, são exemplos desta não acolhida, pois, eles se fecham em si mesmos e impõem com certa truculência aos demais e diferentes, suas vontades e desejos, o que também chamamos de vícios ou desequilíbrios. E isso vai contra a ordem dinâmica e fluente da naturalidade. Nestas imposições não há fluxo nem energia sutil vital, apenas impedimentos e impulsos para um aniquilamento a que muitos chamam de morte. Para nós, a morte é uma mutação ou transformação, pois a energia, o espírito - e o Tao, são eternos, fornecendo natureza e vida, portanto, continuidade, para todos os seres.

"Onde governa a tolerância,
O povo tem tranquilidade;
Onde governa a discriminação,
O povo tem insatisfação."

(Tao Te Ching, Lao Tse)

Em termos de vida em sociedade, o que defendemos é o respeito e a compreensão entre as diferentes culturas e/ou conhecimentos, tendo o diálogo e a retidão (ver conceito no taoismo) como instrumentos de convivência, para uma boa convivência, onde a diversidade seja um elemento de equilíbrio, fundamental para a dignidade de nossas existências.

Professor Herman Silvani.



domingo, 9 de dezembro de 2018

Kung Fu no Brasil: para além da rede social e do discurso


Aos livres de pensamento e estudantes, cuidado com aquela que se gaba ser ‘a maior comunidade virtual (de rede social) de Kung Fu do Brasil’. Por trás deste discurso, existe hipocrisia, vaidade, ego, arrogância, autoritarismo e preconceitos. Discursos que tentam se camuflar em profissionalismo, conhecimento, sabedoria, razão, moral, mas que no fundo são apenas uns discursos moralistas, como tantos. Mulheres praticantes de Kung Fu já se retiraram desta comunidade por sofrerem discriminação de machistas ‘donos da verdade’ que lá se exibem. A história do movimento negro e da capoeira também já foi discriminada naquele espaço, assim como, mais recentemente, se permitiu apologia à ditadura militar. A moderação, claramente é partidária (no sentido ideológico), mas diz que não. Censura muito daquilo que não concorda e elege conteúdos conforme seus interesses ideológicos. Segmenta e segrega, numa prática típica de regimes totalitários – então, não é a escolha de conteúdo o problema, mas sim, a forma como isso se dá.

Os figurões que por lá desfilam (alguns ditos mestres ou sifus – uns podem até ser, não questiono seus quesitos técnicos, pois não é disso que se trata), alguns bem conhecidos pela ‘comunidade marcial brasileira’, tem o Kung Fu como um mero negócio ou como forma de se manterem em evidência, aproveitando-se de certo status ‘idealizado’ culturalmente aqui no Brasil. Um deles, por exemplo, que, se dizendo budista, já se manifestou favorável a pena de morte, o mesmo que também já foi flagrado num surto de desequilíbrio batendo em aluno (e lá se foi seu Kung Fu por água abaixo). Outro se comporta como meritocrata segregador, um ‘empresário do ramo Kung Fu’, usando de ensinamentos escritos e símbolos fundamentais desta arte, como mero discurso para fisgar clientela. Figurões que, volta meia - e sempre os mesmos - agem de forma truculenta, arrogante, medíocre, frente a conteúdos que não conhecem ou que não concordam, mas tem passe livre para imporem seus interesses e discursos elitistas, já que, alguns deles controlam a referida comunidade.

De minha parte (e que sei, de tantos outros e outras), não dignificam este conhecimento milenar e rico em possibilidades que é o Kung Fu. Ao contrário, com suas posturas e atitudes, deturpam, detratam, distorcem, amesquinham, diminuem, desrespeitam uma cultura e conhecimento amplo, dinâmico e profundo, o tornando um produto que, pelos mais sensíveis e críticos, muitas vezes é motivo de piada. Eu e muitos outros(as) que trabalham com sinceridade e vivem o Kung Fu nos seus cotidianos (para além do quesito tecnicista e do discurso ou das aparências), me sinto leve ao saber que não pertenço a este ‘grupo’ de ‘coronéis arcaicos’ que se postam como ‘donos do Kung Fu nacional’, mas que não dignificam esta arte que amamos e nos esforçamos para manter viva, coerente e digna aqui no Brasil. Infelizmente nosso fator cultural brasileiro (crença e modo de vida) tende a ‘consumir’ aquilo que é mais aparente e fácil de assimilar publicitariamente e ideologicamente falando, o que acaba dando força para estes ‘empresários-publicitários’ e ‘coronéis’ do Kung Fu no Brasil. Mas, felizmente, existem muitos outros/as sifus, mestres e mestras no Brasil, assim como praticantes que fazem jus a este conhecimento que, para nós, é uma necessidade, não um status. E é com estes/as que me junto neste Caminho.

Nisso, agradeço a todos os irmãos/ãs Kung Fu do Brasil que vivem esta magnífica arte, cultura e conhecimento na sua essência (ou que pelo menos buscam isso), ultrapassando as aparências e discursos ideológicos que a detratam. Seguimos juntos no trabalho de dignificar nossa arte, fluindo, dialogando, estudando, produzindo, e sendo assim resistência a dureza dos que não fluem, mas impõem. 

O suave e o fraco vencem o rígido e o forte” (Lao Tse).



quinta-feira, 29 de novembro de 2018

“Essência” (Ching – e outros conceitos) no Kung Fu: um caso de percepção, sensibilidade e incorporação

Uma questão imprescindível nos estudos e/ou práticas ‘marciais’ chinesas (Kung Fu), sob tudo referente as escolas, associações, famílias ou linhagens que trabalham (declaradamente) o aspecto ‘interno’ das ‘artes marciais’, é o uso dos conceitos fundamentais. Entre eles estão os conceitos de Chi (energia sutil e vital interna), Ching (essência) e Shen (espírito/consciência), também chamados de ‘três tesouros’. Nisso, também incluo o conceito de Yi (intenção), como fundamental no estudo e prática do Kung Fu. Ambos conceitos desenvolvidos, estudados e praticados por antigos mestres taoistas. Heranças valiosas aos que estudam as artes chinesas com mais profundidade.

O taoismo, além de seu caráter ‘religioso’ (tornado ‘religião’ em alguns casos, mas que começou – e continua – como filosofia, sendo que, na tradição cultural-intelectual chinesa, filosofia e espiritualidade não se separam tanto como no ocidente), é um conhecimento filosófico profundo. Iniciou como uma espécie de ‘xamanismo’, onde mestres estudiosos nativos, desenvolveram seus estudos, experiências, junto da natureza, a grande mãe-mestra do taoismo. E foi a partir deste conhecimento e cultura milenar que estes conceitos primordiais hoje são ainda possíveis, aplicados ao mundo da energia, da saúde e das artes marciais – mas não por todas as escolas. Um elo conceitual entre a natureza e o ser humano, que considera, além da natureza, a cultura humana, como um ‘retorno’ ao seu estado natural de ser-estar. Para isso, a linguagem é fundamental, pois, na compreensão destes conceitos, além da tradução, está a simbologia, a interpretação destes conceitos, para que eles sejam possíveis de serem desenvolvidos na prática. Diferente de muitos conhecimentos, onde a teoria antecede a prática, o taoismo parte da prática, da experiência para a teoria, que depois retorna para a prática (efetivação), num ‘movimento dialético’, antecipando assim, historicamente, a dialética de Heráclito, depois de Hegel e Marx (guardadas as diferenças e proporções). Nisso, o conhecimento e/ou cultura taoista traz como característica a imanência na sua efetivação, e não a transcendência, como é em muitas religiões, e diferente do que muitos acreditam. Mas este é um assunto para um outro texto que pretendo ainda escrever.

No mundo do Kung Fu (termo popularizado para as práticas marciais de origem chinesa) existem algumas controvérsias quanto a compreensão e aplicação de alguns conceitos, dado a diferentes concepções incorporadas por diferentes ‘escolas’ ou ‘modos’ de se compreender, conceber, estudar ou praticar o Kung Fu. Dentro deste quadro complexo, filosófico, antropológico, sociológico e histórico, podemos pensar as diferentes escolas, estilos e/ou modos de Kung Fu como peculiares, porém, entre alguns deles, existem semelhanças ou ‘raízes’ que, quando não são as mesmas, são parentes entre si. O que também podemos chamar de matriz ou essência. É o caso do Wing Chun e do Weng Chun Kuen, por exemplo. O estilo Garça Branca e Serpente são diferentes, é fato, porém, ambos tem uma essência que, se não for a mesma, é parentesca, e ambos os estilos deram vida ao Wing e Weng Chun, internamente e historicamente falando. Assim como, para quem chega na essência do Wing/Weng Chun e do Tai Chi Chuan, descobre que ambos tem esta ‘raiz’ irmã (senão a mesma), simbolicamente transmitidas pelas ‘raízes’ internas dos estilos Garça Branca e Serpente, os dois estilos (animais-símbolo) que mais carregam o aspecto ‘interno’ dos cinco animais clássicos do Kung Fu (Leopardo, Tigre e Dragão, além dos já citados). Esta ‘essência’ a que me refiro, assim como o Tao, é praticamente intraduzível, inexplicável, pois não são palavras e razão (consciência material) que dão conta de conceituar formalmente esta concepção e/ou ideia, sendo a ideia, neste caso, apenas uma forma de poder referenciar ou minimamente localizar esta ‘essência’ – ter um breve sopro de pensamento sobre ela. Sim, eu sei, isso dá um nó na cabeça, e bem por isso, não é possível com palavras compreender inteiramente do que realmente se trata, é preciso, sentir e saber, independente da razão ocidental(izada). Porém, também não é simples crença, como muitos dizem (sem saber). Entre a crença e a razão, existe o fator percepção, e é neste ‘não-lugar’ (ou lugar) onde a essência, assim como o Tao, estão (e não estão). Ou seja, só praticando e adquirindo, com o tempo, esta sabedoria, que é possível termos certo ‘controle’ dela, o que alguns chamam de ‘afundar o Chi’ ou ‘derreter internamente até sentir o Tan Chien inferior’, onde a energia Chi ‘manipulável’ pode ser sentida e trabalhada, assim, também aplicada na ‘marcialidade’ em forma, por exemplo, de Fa Ging (externização e explosão de energia a partir da essência). Este é um conhecimento que não depende do uso da razão, do simples querer, mas sim, da soma dos ‘três tesouros’ (ver taoismo), mais o Yi, experienciados e muito trabalhados na prática cotidiana do Kung Fu, a partir de seu aspecto ‘interno’, e através do tempo. Para isso, são fundamentais a meditação e o estudo e prática do Chi Kung e/ou do Tai Chi Chuan (no nosso caso, AFWK, também do Wing/Weng Chun internos).

O acesso

Certa mentalidade desenvolvida a partir destes elementos estudados e praticados, e posta em prática, onde se inclui certas práticas cotidianas (mudanças de concepções e atitudes) podem permitir o acesso a este conhecimento que, compreendido e ‘incorporado’, se transforma em sabedoria. E eis que chegamos até a ‘essência’ (Ching), onde conhecimentos como Chi Kung, Tai Chi, Wing Tjun (Wing e Weng Chun), Garça Branca, Serpente, Yi-Ching, Pakua, por exemplo, estilos diferentes, mas que se integram de algum modo na prática ‘marcial’ (e de vida), pois dialogam entre si, a partir desta essência que, se não for a mesma, é parente, convergem, ou no mínimo, dialogam - por isso, são possíveis de serem trabalhadas juntas. Se pegarmos a história destas artes e/ou conhecimentos, desenhados numa árvore, poderemos perceber a ligação direta ou indireta entre elas que, mesmo sendo diferentes, convergem em algum sentido, e é este sentido que, incorporado e amplificado, faz perceber e atingir a essência. Por isso é que, o Caminho não é endurecer, simplificar, diminuir, reduzir em territórios controlados estas artes/conhecimentos, mas sim, fluir entre eles, dentro e fora, tendo-os como irmãos/ãs e não como estranhos ou inimigos. Como diria o GM Liu Pai Lin em outras palavras, ‘a forma é feita para ser deformada, e depois formada novamente...’. Isso é o que a concepção taoista (leia-se ‘dialética’ em movimento ‘espiral’ – por onde anda a energia), nos ensina. Algumas escolas, linhagens ou ‘modos’ que atingem esta essência e podem ser citadas de exemplos, são a escola de Wing/Weng Chun do Vietnam, a partir do GM Yuen Chai Wan e a IWKA, do GM contemporâneo Sergio Iadarola (grandes referências para a AFWK).

Diferenças não são impossibilidades

Estilos, modos, formas parentescas, mesmo em tempos diferentes, porém ligados pelo Caminho (Tao), podem nos levar à essência. Uma vez chegando lá, não há retorno, pois, outras possibilidades, como portas, se abrem, que levam para um novo, porém mais amplo, fluente, dinâmico, flexível e profundo caminho. E tudo se inicia com o relaxamento e a mente flexível, e vai até a incorporação e percepção deste Caminho. Depois disso, é seguir nele, estudando, praticando, vivenciando, dia após dia, este novo estado de ‘espírito’ (Shen). Por isso, amigos/as, ao invés de construir muros e viver rígidos como concreto, vamos fluir como água.
Espero com isso ter trazido à tona algumas reflexões e sensibilidade que possam ajudar no cultivo e trabalho de energia, rumo a naturalização e flexibilidade do ser-estar no mundo, para uma prática do Kung Fu mais ‘natural’, mesmo sendo um desenvolvimento cultural humano - mas que, tem na natureza e seus movimentos, sua grande escola e mestra. Então, façamos jus, dignificando este conhecimento, para além dos estereótipos e dos controles sobre os discursos territorializadores.


* Nas imagens a seguir, movimento/postura da Garça Branca, registrados em tempos diferentes e executados por praticantes diferentes (postura presente nas práticas de Chi Kung, Tai Chi e Kung Fu), exemplo de artes diferentes que possuem ou se encontram na 'essência'.
Na primeira foto, professor Herman Silvani (AFWK), praticando Chi Kung e Tai Chi Chuan (no litoral catarinense, na virada de ano de 2011 para 2012), movimentos que aprendeu em meados dos anos 90 com um praticante (Kung Fu e artes internas) que estudou no sudeste asiático (Vietnam e Indonésia). Na segunda foto, sifu Diep Phuong da 'escola/modo' a partir do GM Yuen Chai Wan (Vietnam). Na terceira foto, uma praticante chinesa.
Ambos (guardadas as diferenças nos detalhes) chegando na mesma forma (em movimento ou fixa) que, nesta sequência, colocada em movimento (circular), vinda de cima para baixo (foto 1) em intensidade água (Tai Chi e/ou Chi Kung), chega na postura mais baixa (foto 3):

















sifu Herman Silvani - do céu para a terra: saindo do movimento (céu) e formando a postura (terra)



sifu Diep Phuong (Vietnam)






quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Wu De (Código de Ética) AFWK


























“Mergulho com o influxo e surjo com o refluxo, sigo o Tao da água e não lhe imponho minha visão egóica. 
É assim que eu me mantenho flutuando" (Chuang-Tzu)


Um artista marcial deve sempre, respeitar, cultivar e defender o Wu De, que são os ‘códigos de ética’ do Kung Fu e/ou da sua escola/associação.


Wu De AFWK:

1. Nunca deve usar suas habilidades marciais para intimidar, atacar ou agredir;

2. Nunca deve subjulgar;

3. Nunca deve cultivar, fomentar ou reproduzir discursos (e atitudes) violentos, que suscitem o ódio ou desprezo às diferenças (étnicas, de gênero, etc.);

4. Nunca deve usar o nome da sua escola/associação, assim como, de seu professor/mestre e estilo marcial para impor-se sobre algumas situações ou sobre os outros. Cabe a cada membro da AFWK zelar pela sua escola/associação e colegas, irmãos/ás Kung Fu, pelas suas imagens e nomes;

5. Deve, através da sua conduta e exemplos pessoais, honrar e respeitar o conhecimento (filosófico, marcial e espiritual) da sua escola/associação, professor e mestres responsáveis por este conhecimento, assim como seus irmãos/ãs Kung Fu.


* Obs.: O descumprimento de uma destas 5 regras básicas e fundamentais, acarretará em ações, que vão da 'involução' do estudante dentro do currículo, do afastamento ao banimento do praticante da escola/associação.

“A primeira batalha que devemos travar, é contra nós mesmos” (Sun Tzu)


6. Deve ser perseverante e dedicar-se aos estudos, treinos ou práticas, cumprindo com sua responsabilidade frente ao conhecimento e seus espaços de aprendizado;
7. Nunca deve subestimar, difamar ou menosprezar;
8. Deve ser humilde, sereno e prezar sempre pela justiça;
9. Deve ter controle sob si próprio (mental, emocional e energético-corporal), buscando sempre o equilíbrio;
10. Deve ter seu professor e irmãos/ãs Kung Fu, como agentes de seu próprio desenvolvimento humano, sendo leal com sua escola/associação e a filosofia que a permeia.


"Quem conhece os outros é sábio; / Quem conhece a si mesmo é iluminado." (Lao-Tsé)  





“Ego é o receptor e o abrigo dos desejos e apegos do ser humano, e o seu esvaziamento é a diminuição das impurezas da mente, que irão permitir o progresso no Caminho.” (mestre Wu Jyh Cherng, a partir da interpretação do ‘Tao te Ching’ de Lao Tse)

"Remova o que é falso e só a verdade permanecerá"  (máxima taoista)

"Não sejas um personificador da fama; não sejas um silo de esquemas; (...) ; não sejas o proprietário da sabedoria. Incorpora o mais plenamente que possas o que não tem fim e perambula por onde não há sendas. Aferra-te a tudo o que recebeste do Céu, mas não creias que possuis alguma coisa. Sê vazio, eis tudo." (Chuang Tzu)




segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Nós e o mundo: "O espírito de nosso tempo..."


Além das roupas que vestimos, das coisas que inventamos, das maquinarias e tecnologias, dos ternos e gravatas, coroas e fardas, somos seres naturais, parte de um todo que se chama natureza e que se chama vida. Porém, com o passar do tempo, fomos perdendo o interesse pela natureza, pelas coisas vivas que pulsam diante de nós, e muitas vezes já não percebemos isso. Pensando em facilitar nosso trânsito na vida, criamos instrumentos que nos trouxeram comodidade, distração e ganância. Assim, perdemos também o interesse pela vida e a conexão com nosso íntimo e com a natureza (interna e externa). Nisso, a vida perdeu seu valor para nós, e na maioria dos casos, nem sabemos disso. Estamos doentes e cegos. Doentes de falta de percepção e sensibilidade.

O mundo é um grande pulmão, um grande rim, um grande coração, cheio de energia, a energia que mantém a vida e que nos mantém vivos. Porém, esta energia que pode ser boa, também pode ser ruim. E quando o mundo todo padece de mazelas, como o ódio, a guerra, a fome, a violência, a destruição da natureza, nós padecemos em desequilíbrio e diminuição significativa de energia (Chi) positiva. Então, assim, estamos morrendo.

Somos e vivemos um todo. Mas, perdemos esta inteiração, esta integração, esta noção de ser-estar natural junto à vida e ao outro. O mundo sofre com isso, mas a morte é nossa, do nosso corpo, da nossa cultura, do nosso espírito - humanos. Destruindo a natureza, destruímo-nos. Matando o outro, matamo-nos. A natureza se transforma e sempre volta. Então, somos nós é que morremos. A cada violência contra o próximo, contra a natureza, contra a vida. Estamos condenados? Talvez! Mas, acredito que ainda há tempo e forma de mudar e buscar de volta a vida, seu valor e a natureza.

A energia de cada um de nós, é a energia vital que há em nós. Uma só energia que, ou está saudável, ou está doente. Somos seres naturais, mas também culturais. Então, cabe a nós, cultivarmos. Cultivarmos a energia positiva ou negativa, a paz ou a guerra, a tolerância ou a intolerância, a flexibilidade ou a rigidez, a vida ou a morte. Energia que formando o todo, também chamamos de ‘espírito’, de uma época, de um tempo, de um mundo, da vida. Portanto, o 'espírito do tempo, é o que fizemos dele'. Nisso, a escolha é nossa, é sua... Escolhe!



domingo, 7 de outubro de 2018

Wing/Weng Chun, uma arte de resistência

Os sistemas Wing e Weng Chun (Kuen) de Kung Fu, nasceram num contexto de opressão e domínio militar da dinastia Qing, dos manchus, por volta de 1700 do calendário cristão, como forma de resistir a este domínio. Mestres e/ou estudiosos de outros estilos de Kung Fu (como a Garça Branca e a Serpente), através de certo tempo, foram desenvolvendo esta(s) nova(s) arte(s) (na época), a modo de uma maior efetividade defensiva contra as investidas dos soldados do exército manchu no sul da China. Este é o contexto do surgimento do Wing/Weng Chun. No caso, esta(s) arte(s) não nasceram no exército (portanto não são artes de caráter militar, e isso é bom que se diga, pois muitos praticantes as tratam como tal), são sistemas defensivos (nos seus sentidos técnicos) e anti-opressores, no sentido histórico.

Dito isso, é fundamental que os mestres e professores, suas associações ou escolas, enfatizem este aspecto sociohistórico no que diz respeito ao surgimento destes sofisticados sistemas de Kung Fu. Nisso, o WT (sigla para Wing e Weng Chun), é um sistema de características, além de defensivas, libertárias, no sentido de resistência contra a opressão de um Estado ditatorial, como fora a dinastia Qing.

Nisso, a AFWK respeita e busca fazer jus a esta história, concebendo, estudando e/ou praticando WT como uma arte defensiva e libertária, e não militarizada, nem opressora ou totalitária, como, muitas vezes, a partir de certos discursos e atitudes de professores e praticantes, se vê por aí.

Uma das grandes características do sistema WT, no seu sentido contextual histórico, é a resistência ao domínio e opressão, e sendo ele também uma cultura (um modo de ver a vida e nela se posicionar, a partir de seus Wu De – códigos de ética), a coerência pede que assim ele seja tratado. Ou seja, um sistema que, além do quesito técnico, possui certos princípios sociohistóricos que devem ser considerados e respeitados. Não feito isso, julgamos o sistema ‘incompleto’.

Em suma, o WT, fundamentalmente, é um sistema que presa pela ‘liberdade’ e pelo aspecto defensivo (busca pela ‘paz’ ou contra a guerra e domínio opressor, seja ele qual for), pois isso faz parte de sua composição, o que também o faz ser uma arte de resistência. 




quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Posição da AFWK frente ao momento político-eleitoral brasileiro

A AFWK (Associação Fluir Wing Tjun Kung Fu), vem por meio deste, se manifestar pela paz e flexibilidade (‘democracia’), frente ao atual processo eleitoral e quadro político nacional.

Como uma associação ou escola de Kung Fu, filosoficamente taoista, atuamos em favor da serenidade, flexibilidade, sensibilidade e reflexão. Assim sendo, em favor do respeito e do diálogo consciente entre seres humanos. Um dos princípios fundamentais do taoismo é o equilíbrio, assim como do Kung Fu, disposto nos Wu De (Códigos de Ética), é a paz, tanto de espírito quanto a existencial, sendo um dos maiores sentidos do Kung Fu, presente simbolicamente na sua mais usual saudação: ‘parar com a guerra’.

Nisso, a partir de certo discernimento e coerência com nossa cultura, conhecimentos e práticas, não apoiamos, de forma alguma, candidatos, propostas ou discursos que propagem a violência, a discriminação, o preconceito e o ódio.

Por isso, enquanto um espaço cultural educativo e filosófico, independente de ideologia, religião ou partido político, somos favoráveis ao voto consciente e humanizado, no sentido de respeito ao outro e a natureza que nos abrange e nos cerca. Prezamos pela diversidade e pelo respeito às diferenças, e não pelas imposições autoritárias, sejam elas quais forem e de onde vierem.

Gratos pelas suas atenções! Em nome da família Fluir Kung Fu (AFWK)...











Att.

Herman Silvani (professor) 



segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Modismos e as deturpações que eles causam: fenômeno típico da sociedade das aparências

Além do conservadorismo neofascista motivado por alguns ‘líderes políticos’ e/ou religiosos, de estilos musicais midiáticos como o sertanejo sofrência e universitário e funk ostentação (estilos massivamente vinculados nas emissoras de TV e rádio), tá na moda a arte marcial fitness, o consumo de orgânicos e artesanais, o yoga, o uso banal de ayahasca e do rapé (muitas vezes usados como drogas e não como espiritualidade pelos modistas), ambos conhecimentos que foram ocidentalizados, entre outros produtos da indústria do espírito, da mentalidade e do corpo padrão-idealizado. Mas, parte disso tudo, do que vivemos na sociedade ocidental (platônica judaico-cristã), é discurso e modismo, e não necessariamente realidade com toda profundidade que ela pode ter. Fruto da busca enlouquecida de muitas pessoas por algum sentido de vida além do materialismo e tudo o que as engole e as torna parte de um mecanismo de controle e mecanização dos dias, horários, da mente, corpo e alma. E que bom que muitos estão buscando caminhos ‘alternativos’ para ser estar no mundo. Porém, muitos destes caminhos não são os autênticos, sinceros, ampliadores de mentalidade, espiritualidade e percepção de mundo, não são nem caminhos, são desvios, atalhos, distorções, alimento de vaidades e egos, dentro de uma lógica da ‘sociedade do espetáculo’ (sociedade das aparências e de consumo), onde muitos, buscando preencherem seus ‘buracos’, furos ou faltas, se atiram de cabeça em práticas que muitas vezes não são bem estruturadas nos seus sentidos internos. 

Estas práticas, sem suas ‘filosofias’, sem seus estudos conceituais, que levam realmente à uma mudança de comportamento e prática sociocultural, são meras distrações, alegorias e/ou artefatos que servem de alimento do teor egóico, assim como das aparências, que banalmente enchem a sociedade de imagens, discursos, mas não necessariamente de vidas plenas e integradas ao espírito do todo natural e sociocultural. É muito comum hoje em dia, por exemplo, vermos pessoas que se dizem consumidoras de orgânicos, mas que se manifestam contra seus produtores, no caso, a agricultura familiar e movimentos sociais como o MST e a Liga Campesina (maiores produtores de orgânicos do mundo). Pessoas que praticam yoga ou alguma arte marcial oriental, artes filosoficamente pacifistas e espirituosas, assim como muitos que se dizem cristãos ou budistas, mas reproduzem discursos de ódio e praticam violências.  

Nisso, às vezes penso que parte significativa do brasileiro tem o ‘dedo podre’, ou seja, opta quase sempre por aquilo que é aparente, geralmente anunciado como bom e saudável, a partir de certo discurso e propaganda publicitários, pura produção e retórica, caindo nos artifícios do mercado e sua publicidade, passando a consumir e praticar a superficialidade das coisas, nunca chegando assim até a essência. Esta é a diferença de uma coisa e de outra. Para além das palavras e da aparência, está a essência, e é disso que estou falando. Além de parecer e falar, é preciso viver, praticar, estar integrado ao conteúdo que se diz praticar ou fazer parte, e além da parte externa, também interna. No taoismo chamamos isso de ‘estar no Caminho’.

            Em suma, é necessário ‘estar no Caminho’, integrado, afinado ou equilibrado neste fluxo que a própria vida ou natureza nos oferece como uma condição e não como uma simples fuga ou desvio, onde muitos estão ou como muitos praticam. É a necessidade que deve guiar estas escolhas, estes caminhos, estas buscas, e a partir disso, a sinceridade em ser e estar neste todo, pois, uma vez tocada a essência, ela passa a fazer parte de nós, e nós, dela. Quem não busca ou não chega na essência, permanece na superfície, e esta é a diferença entre a aparência e a essência, entre o estereótipo e a verdade, entre necessidade e vaidade. 




sábado, 11 de agosto de 2018

O Wing Tjun taoista da AFWK

Volta e meia, alguém, percebendo nosso ‘modo’ de Wing Tjun (às vezes não compreendendo bem do que se trata, devido a forma escrita ser diferente da mais usual, assim como, de alguns movimentos, posturas, formas, também diferirem do ‘modo’ mais difundido, que é o modo Ip Man), me pede sobre nossa linhagem, estilo ou modo.

O fato é que não temos uma linhagem em específico, o que temos é um ‘modo próprio' (como tantos outros existentes mundo a fora), filho da necessidade e realidade locais e da soma de alguns conhecimentos. Portanto, possuímos fundamentos e referências (o que compõem um currículo próprio) que nos proporcionam tal Caminho.

De uma maneira mais geral e ‘resumida’, nosso modo de WT tem referência no sul da China e sudeste asiático (Vietnã, Indonésia, Filipinas).  Na AFWK estudamos e praticamos os sistemas irmãos Wing Chun e Weng Chun Kuen, além de aspectos dos estilos Garça Branca e Serpente (antepassados familiares do WT), integrados as chamadas ‘artes internas’, sob tudo Chi Kung e Tai Chi (ênfase no estilo Pai Lin). Também algo de I-Chuan e 18 mãos de Lohan (Chi Kung / Garça Branca), e em menor grau, alguma relação com um estilo de Kung Fu chamado Chu Ka, e com o Pa Kua (estilo taoista). O WT da AFWK é ‘interno’ e ‘externo’ (pois praticamos os dois vieses).  

Grandes Mestres e seus ‘modos’, escolas ou linhagens, como Leung Jan, Yuen Chai Wan, Wang Xiang Zhai, Kwee King Yang, Ip Man, Liu Pai Lin, Tang Yik e Wu Lyh Cherng (entre outros), estão entre nossas principais bases e referências.

O WT da AFWK é taoista, e por isso também o chamamos de ‘Fluir Kung Fu’, onde nossa grande base filosófica-conceitual está nas sabedorias e conhecimentos deixados principalmente por Lao Tse e Chuang Tzu. Mas, com isso, não desconsideramos outras fontes, e estudamos e aplicamos em nossa prática conceitos vindos do budismo, confucionismo e de pensadores estrategistas como Sun Tsu.