* Dai Dak Lan, local onde alguns mestres de linhagens distintas se encontravam para troca de conhecimentos
O Wing Chun é um sistema dentro daquilo que se conhece popularmente por Kung Fu, pois é tido como parte deste 'todo' (conhecimento e cultura). É uma arte/conhecimento que, como tantas, varia no tempo e espaço. São várias linhagens, estilos e modos de se conceber e estudar/praticar o WT (abreviação). Alguns mais específicos que outros. O estilo ou modo mais popular do mundo é o que foi desenvolvido pelo GM Ip Man, um sincretismo (fusão) de outros modos provindos dos mestres e praticantes com quem se relacionou, estudou e aprendeu. O estilo Ip Man ficou muito popular, além da fama de sua eficiência e simplicidade, pelo seu aluno mais famoso, o ator, dançarino e artista marcial Bruce Lee. A popularidade aumentou nos últimos anos devido aos filmes e séries onde o mestre Ip é personagem protagonista, e por causa da internet. Mas, além do estilo ou modo Ip Man, tantos outros, tão bons quanto ele, existem mundo afora. Alguns seguem tradições e linhagens específicas, enquanto outros, como o próprio Ip Man fez e outros grandes mestres fizeram (e ainda fazem), são frutos deste sincretismo, desta fusão entre conhecimentos 'irmãos' ou parentes. Portanto, a questão não é simplesmente aquilo que você representa ou segue enquanto conhecimento, mas aquilo que você estuda, pratica, vivencia e, principalmente, aquilo que você faz com estes conhecimentos.
Neste mundo muitas vezes conflituoso, onde ego, vaidade, território e controle são comuns, alguns praticantes tentam impor para outros suas crenças e realidades, não respeitando as diferenças e a variedade das fontes, dos fundamentos, dos modos de se aprender, herdar e transmitir conhecimentos. As fontes, bases e/ou raízes são diversas e, como já foi dito aqui, variam no tempo e espaço, tanto que, aquilo que dizem ser 'puro', geralmente sofreu alterações ao longo do tempo. Isso se comprova ao percebermos as diferenças existentes entre sifu's que vieram de uma mesma linhagem ou escola e seus diferentes modos existentes por aí (é isso o que chamo de 'modo'). Assim, podemos ter mais de um modo dentro de um mesmo estilo. Exemplo: modo Wong Shun Leug e modo Leung Ting, do estilo Ip Man. Nisso, o que configura o estilo é a 'essência' ou os fundamentos básicos fundamentais deste estilo.
Características próprias nos modos ou estilos, quando percebidas por aqueles que estudam o sistema, não só o seu modo, mas outros modos ou estilos, estão presentes nos movimentos e técnicas, podendo ser assim observáveis ou perceptíveis. Mas, quem tem conhecimento suficiente para perceber estas diferenças? Aquele que estuda, trabalha sua sensibilidade e percepção. Aquele que observa mais do que fala. Aquele que é aberto às diferenças e à história. Não é requisito ou obrigação saber distinguir, localizar estas diferenças, estas variações, estes estilos ou modos. Mas é de bom senso e coerência respeitar, e quando não souber, não julgar, pois, se não se sabe, não se detrata. Isso é premissa básica para qualquer aprendizagem. E não é porque você pertence a uma sigla, uma linhagem, um estilo ou modo 'único' e específico, nem porque pousa em fotografia ou representa esta ou aquela escola ou mestre, que você é melhor ou superior aos outros, nem que seu estilo seja, e muito menos que o seu conhecimento seja maior, mais digno ou coerente. Isso tudo é muito relativo.
Cada modo pode ter seu próprio fundamento, sua própria intenção e interpretação do conhecimento. E foi isso o que grandes mestres fizeram ao longo do tempo, tanto que, seus alunos que se tornaram sifu's, herdaram e transmitiram coisas diferentes. Em suma, a gama de possibilidades é imensa, e isso é o que enriquece o Wing Chun. Respeito às diferenças e sinceridade com o que se faz é o básico. Nisso, o WT, um rico sistema, muitas vezes é empobrecido por aqueles que falam em nome de uma suposta pureza ou verdade, mas que é a sua, ou da sua escola ou crença. A realidade, a história, é algo mais dinâmico e complexo do que este determinismo reducionista.
Todo respeito e consideração às linhagens, famílias, escolas, grandes mestres, mesmo porque os conhecimentos vem disso. Porém, isso não significa que deva ser uma ditadura ou um fundamentalismo religioso, como tantos por aí fazem ser. Perceber, ver e reconhecer a diferença, a diversidade ou variação, refina o olhar e abre maiores possibilidades de compreensão e conhecimentos. Ao contrário, limita.
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